Domicílios e Famílias

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Até a década de 1950, os quesitos sobre domicílios não eram ordenados de modo a compor por si só um bloco autônomo nos questionários. Além disso, os quesitos eram preenchidos diretamente pelo chefe do domicílio. Em 1960, cresceu o número de perguntas dedicadas ao tema (passando de 5 para 13), no entanto, a aplicação dessas questões se tornou restrita à amostra. Somente em 1980 houve expansão desse escopo para toda a população; e nesse mesmo ano, o bloco sobre domicílios passou a compor uma seção relativamente autônoma do questionário (anteriormente ocupava apenas um pequeno espaço nas laterais da página).

Na investigação desse tema, é fundamental a distinção conceitual entre “domicílio” e “família”—e as fronteiras semânticas entre os dois termos variou muito ao longo do tempo. Domicílio é a unidade de habitação dos indivíduos e sua definição baseia-se, atualmente, em dois critérios: independência e separação. De acordo com o IBGE,

 

A separação fica caracterizada quando o local de moradia é limitado por paredes, muros, cercas etc., coberto por um teto, e permite que seus moradores se isolem, arcando com parte ou todas as suas despesas de alimentação ou moradia.

A independência fica caracterizada quando o local de moradia tem acesso direto, permitindo que seus moradores possam entrar e sair sem passar por local de moradia de outras pessoas.

(IBGE, Notas Técnicas da PNAD, 2008)

 

De acordo com a definição acima, separação implica em limitação estrutural da construção e relativa autonomia econômica dos moradores. É essa a acepção vigente e que orienta a facção atual dos censos e demais pesquisas domiciliares do IBGE. No entanto, nos censos de 1960 e 1970, apenas esteve presente a noção de independência. Em 1980 foi incluída a separação - no entanto, ainda sem a dimensão econômica, que define que os moradores tenham que arcar “com parte ou todas as suas despesas”. Apenas em 2010 a noção completa é adotada e cabe destacar que tal definição já vigia nas PNADs e na POF mais atuais. A implicação mais óbvia dos fatos apontados acima é a de que as mudanças conceituais engendram também mudanças nas formas de enumeração e contagem e isso pode gerar incompatibilidades entre os censos.

A família é definida como o núcleo básico de reprodução (em contraposição ao domicílio, núcleo de produção). Formalmente, por família censitária, compreende-se:

 

o conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, que residissem na mesma unidade domiciliar e, também, a pessoa que morasse só em uma unidade domiciliar. Entendeu-se por dependência doméstica a relação estabelecida entre a pessoa de referência e os empregados domésticos e agregados da família e por normas de convivência as regras estabelecidas para o convívio de pessoas que morassem juntas sem estarem ligadas por laços de parentesco ou dependência doméstica.

(IBGE, Notas Técnicas da PNAD, 2008)

 

No censo de 1960, pela primeira vez se introduziu a diferença conceitual entre domicílio e família, o que permitiu a identificação de famílias conviventes dentro de uma mesma unidade. No entanto, a diferença entre a quantidade de domicílios e de famílias é irrisória nesse primeiro ano - o que certamente se deve a um artifício da coleta de dados, que identificava, a priori, as famílias residentes. Em 1980, a identificação das famílias passa a ser feita por meio da entrevista e inclui-se a possibilidade de haver uma chefia para as famílias conviventes diferente da chefia do domicílio (que é identificada com a chefia da “família principal”). Tanto os critérios para a definição da posição de “chefe” como para a diferenciação entre “família principal” e “convivente” nunca receberam uma definição completamente explícita e livre de ambiguidades (geralmente está associada à posição de responsabilidade econômica, de proprietário ou locatário, etc.) Essas ambiguidades se transferem para a análise dos dados provenientes deste modelo de coleta - e um exemplo eloquente é aquele da crescente chefia feminina de domicílios.

Ainda assim, o conceito de família censitária (ou grupo familiar) não se alterou substantivamente no tempo. Porém o censo de 2010 eliminou do questionário o conceito e a investigação sobre as famílias censitárias. Nesse último censo, os indivíduos responderam apenas com respeito à sua posição no domicílio. Não obstante, o IBGE afirma que através de um tratamento computacional será possível, a posteriori, a identificação de famílias conviventes. Ainda assim, é possível que as famílias operacionalmente identificadas não sejam conceitualmente equivalentes às medidas nos censos anteriores.

O número de famílias residentes em um domicílio tem ainda a função de auxiliar na distinção entre domicílios coletivos e particulares.